Se são rosas, florescerão


Lourdes vem se aproximando, ali entre as crianças correndo e os idosos caminhando, devagarzinho em passos descompassados. Via-se nervosismo em cada pouso dos seus pés sobre o chão. A minha agitação só aumentava. Antes de sair de casa, tive a ideia de lhe trazer algo. Durante sete minutos fiquei pensando o quão careta eu pareceria. Finalmente, decidi que seria careta, mas eu o faria. Depois, durante nove minutos fiquei pensando no que levar. O que não foi fácil, pois eu só tinha vinte e cinco reais. No caminho, dei-me conta de que mulheres se emocionam com flores e quem sabe se eu levar algumas para Lourdes, ela se emocione tanto que poderíamos até trepar. Tudo bem, nada de sonhos em demasia. Mas não deveria ser doces, sei que ela gosta, mas se não parar de se empanturrar de açúcar não passará pelas portas. Finalmente ela chega. Parecia vir em câmera lenta. Talvez fosse meu inconsciente ajudando a preparar-me melhor para o choque de encontrá-la após o nosso beijo de ontem à tarde. Ela traja a paixão, o desejo. Um vestido vermelho de decote pudico, ingênuo. Ah! Ela sabe o que o vermelho me desperta... Talvez ela não seja tão santa assim. Não importa. É melhor que eu pare de pensar nestas coisas antes que ela perceba. Lourdes sorri. Apenas sorri. Será que ela não gostou? São rosas vermelhas e custaram todo os vinte e cinco reais que eu tinha. Ah! Lourdes, doce Lourdes, como você está linda. Mas bem que podia dizer alguma mísera palavra, não é? Bem na hora! Por nada, menina Lourdes, foi um prazer trazer-lhe estas flores. Agora, entre suas mãos, o meu rosto. Olhava-me séria o fundo dos olhos, olhar resoluto. Nenhuma palavra. Meu Deus! Que sensação. O silêncio está pesado de alusões. Que tal falarmos sobre o casamento real? Deixa para lá. Está bem, eu sentarei com você nesta grama. Deitar do seu lado? Tudo bem, um terno abraço. A praça estava cheia de pessoas e o barulho só matava a luz do sol. A temperatura do ambiente está boa. O ambiente? É preciso que eu encontre imediatamente um assunto para conversar. Um super assunto, que não acabe nunca. Digo que a amo agora? Eu ensaiei bem antes de estar aqui. "Lourdes, ontem foi inexplicável. Senti coisas que nunca senti antes. Tudo num beijo só. Acho que estou apaixonado. Não... (Preciso parecer bobinho e confuso, assim é mais fácil) Eu tenho certeza! Aceita ser só minha, Lourdes?". Caramba! Foi mais difícil que eu imaginei. Antes, você se sente o super-homem, protegido pelas pessoas que lhe rodeiam. Seguro de si e descontraído. Mas numa hora dessas, Ah, mas em uma hora dessas você se sente pior que o verme. Principalmente por que treme. Quê, Lourdes? Eu quase me mato para falar isto e é o que me fala?

As flores não são lá tanta coisa. Ele podia ter feito melhor. Quiçá, orquídeas. Tulipas vermelhas significam amor eterno, meu tesouro. Sua cabeçinha linda pode ir mais além que simples rosas, sei disto. Como se eu não lesse seus pensamentos daqui, heim? Olhe os meus olhos. Veja-me além do vestido pintado pela cor do pecado, veja-me atrás dos seus olhos. Depois de ontem à tarde, quando selamos nosso amor com aquele beijo, percebi o quão bobo você é. Não consegue, agora, dizer uma sequer palavra. O pior? É que também não consigo cuspir uma sequer palavra. Todas presas à entrada do esôfago, na ponta da língua, guardadas e trancadas em minha bolsa. Que tal se nós falarmos sobre o casamento real? Deixa para lá. Talvez ele me ache romântica ou fútil demais por tocar neste assunto. Estaria certo no quesito fútil. É melhor que eu segure o seu rosto e apenas olhe no fundo dos seus doces olhos. Não precisaremos de palavras, o silêncio nos faria duas almas num só corpo. Antes que eu me apaixonasse perdidamente pelo que eu enxergaria o olhando na alma, finalmente falei: "Venha cá, deita ao meu lado sobre esta grama". Ah! Noah, você realmente sabe o quanto preciso deste seu abraço? É como um elixir para minha vida esvaecida. Noah, eu também o amo, mas ainda não sei o que lhe dizer. Perdoe-me a falta de resposta. Se eu fosse um espelho, você veria como me olha apaixonado. Isto é o que me assusta, querido. Por favor, não me olhe com este olhar atônito e preocupado. Espero que não se importe agora, que me entenda depois. Mas a única coisa que posso lhe dizer é: "Vamos contar histórias?". Eu sei, meu amor, não é fácil começar a contar histórias nesta situação, com sua cabecinha no meu leito, seu ar embaraçado.

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